Pedro de Alcântara, um Imperador Cansado

 

Por que o Governo Imperial Permanecia Inerte Diante das Evidências do Golpe? Como Estada a Saúde de Pedro II às Vésperas da Proclamação da República? Como o Imperador Reagiu à Notícia da Proclamação? Por Que o Conde d’Eu Não Era Bem Visto Pelos Republicanos?

 

Isabel e Conde d'Eu

 

Um enigma desafia até hoje muitos historiadores da Proclamação da República, pois apesar de todas as evidências de uma conspiração em andamento, o governo Imperial permaneceu inerte. Nos dias anteriores ao golpe, o Imperador comportou-se o tempo todo como se nenhuma ameaça rondasse o trono. A seu ver, estava tudo tão absolutamente calmo que julgou desnecessário reunir-se com qualquer membro do governo nos dias que antecederam a queda do Império. Nenhum de seus ministros preocupou-se em alertá-lo sobre os boatos que tomavam conta da cidade.

Como explica tamanha apatia? Max Leclerc – jornalista francês que percorria o Brasil à época – registrou: _ “A revolução está terminada e ninguém parece discuti-la. Mas os que fizeram a revolução não tinham a intenção de fazê-la e há atualmente na América um Presidente da República à força. Deodoro desejava apenas derrubar um ministério hostil ”.

Ninguém simbolizava mais esse quadro de letargia do que o próprio Monarca. No crepúsculo do Segundo Reinado, um D. Pedro II doente, cansado e “velho antes do tempo” – como definiu o sociólogo Gilberto Freire – nem de longe lembrava a figura poderosa e carismática que por quase meio século conduzira com sabedoria os destinos da nação.

Dom Pedro II era um homem frágil e, na juventude, era sujeito a frequentes ataques de epilepsia. A partir da meia-idade tornou-se vítima de diabetes. Os problemas de saúde se agravaram muito nos 2 anos finais do seu reinado. Em fevereiro de 1887, enquanto ele assistia a um concerto, foi atacado por uma dor de cabeça tão forte que se viu obrigado a retirar-se do camarote em que se encontrava. Sua memória ficou bastante abalada e alguns auxiliares chegaram a pensar que estivesse perdendo a sanidade mental. A Princesa Isabel, que se encontrava na Europa, foi chamada às pressas.

O quadro pareceu tão grave que os médicos aconselharam tratamento na Europa e, diante disso, ele embarcou no final de julho de 1887, em companhia da Imperatriz e do neto Pedro Augusto, enquanto a Princesa Isabel assumia a regência pela terceira vez. Na sua ausência de um ano e dois meses, era tal a convicção de que o Imperador não retornaria com vida que, em artigo em um jornal, o republicano Quintino Bocaiúva se referiu ao navio que o transportava como “esquife da Monarquia”.

Internado durante 2 meses em uma estação de águas na Suíça pareceu se recuperar e, na manhã de 3 de maio, teve uma súbita recaída em Milão. Chamado às pressas, seu médico registrou que o aspecto de D. Pedro II era assustador e, prostrado na cama do hotel, parecia agonizar e chegou a receber a extrema-unção. A situação era tão delicada que, ao receber a notícia da aprovação da Lei Áurea, a Imperatriz inicialmente relutou em mostra-lo ao marido, temendo que a emoção pudesse agravar-lhe o estado de saúde.

D. PEDRO II Doente

Por fim, decidiu que era melhor contar logo as novidades a D. Pedro que abriu lentamente seus olhos e perguntou: _ “Não há mais escravos no Brasil? ”. “Não há” – respondeu a Imperatriz – “a lei foi votada no dia 13 e a escravidão está abolida”. “Demos graças a Deus” – murmurou o Imperador. “Grande povo! ”. E desatou a chorar copiosamente. Ao retornar a Europa em agosto de 1888, tinha a aparência de um inválido. Aos 62 anos, dava a impressão de um homem velho de corpo e espírito, com aparência de um ancião, barba e cabelos esbranquiçados, andar pesado e arrastado – relatou seu biógrafo Heitor Lyra.

Tornou-se forte o rumor de uma abdicação em favor da Princesa Isabel, o que só fez aumentar a resistência a um eventual terceiro reinado. Uma hipótese muito discutida foi que a própria Isabel também abdicaria em favor do sobrinho – o Príncipe Augusto, filho de sua falecida irmã Leopoldina. Assim afastaria o risco de que o trono brasileiro fosse ocupado, indiretamente, por um estrangeiro, o francês Conde d’Eu.

As preocupações sobre a saúde do Imperador e sua capacidade de conduzir os destinos da nação eram partilhadas na família real. “Nunca, nos últimos 40 anos, a situação da Monarquia brasileira pareceu mais instável do que hoje” – escreveu o Conde d’Eu numa carta ao pai, o Duque de Nemours, em 23 de agosto de 1888. Em maio de 1889, o Conde d’Eu anunciou que faria uma viagem ao Norte e Nordeste do Brasil com o objetivo de defender o Império contra os ataques agressivos dos republicanos. Dificilmente haveria pior garoto-propaganda para a Monarquia. O Conde viajou sozinho, deixando a Princesa Isabel no Rio de Janeiro. Os críticos viram nisso a prova de que, na eventualidade de um terceiro reinado, seria ele o verdadeiro Imperador do Brasil.

O Conde foi recebido com festas em várias cidades, mas logo se confirmou a sua falta de habilidade política. Em discurso no Recife, ele afirmou que se a Monarquia fosse derrubada pela República, a família Imperial teria de deixar o Brasil e, essa declaração, acabou causando polêmica no Rio de Janeiro. No dia 15 de julho, quando a família Imperial saía do teatro no RJ alguém gritou: _ “Viva a República” e, em seguida, ouviu-se um tiro que passou de raspão por D. Pedro II.

 

Dom-Pedro-II-trata-da-saúde-na-Europa

 

O autor do disparo – um caixeiro viajante desempregado – foi preso imediatamente e constatou-se não haver ligação com o movimento republicano. Estava embriagado, na porta de um bar onde vangloriava-se de haver atirado contra o Imperador, prometendo voltar à carga visto ter errado o alvo. Era um caso banal, mas serviu de combustível no clima de radicalização reinante na cidade. Em resposta, o chefe de polícia do Rio de Janeiro proibiu qualquer pessoa de dar vivas à República, medida que logo caiu em descrédito.

Enquanto isso, o governo perdia apoio no Congresso e, às vésperas da viagem do Conde d’Eu, caiu o Ministério de João Alfredo Correia de Oliveira – responsável pela aprovação da Lei Áurea. Em seu lugar assumiu o Visconde de Ouro Preto, chefe do último gabinete do Império. Aos 52 anos, deputado por Minas Gerais, ele era o candidato favorito da Princesa Isabel e todos viram na sua chegada ao poder, como uma preparação para o impopular Terceiro Reinado.

Ao assumir o governo, Ouro Preto apresentou ao Congresso um ambicioso programa de reformas. Propôs o fim da vitaliciedade no Senado, a redução dos poderes do Conselho de Estado, que passaria a seu um órgão meramente administrativo, sem funções executivas, a eleição das autoridades municipais, a escolha dos presidentes das províncias entre os mais votados (e não mais por indicação do Imperador), o sufrágio universal, liberdade de culto e a reforma no sistema de educação a fim de estimular a iniciativa privada.

À primeira vista era um programa ousado, mas na prática tratava-se da mesma proposta apresentada duas décadas antes, pelo mesmo Partido Liberal – agora comandado por Ouro Preto – sem nunca ter sido colocada em prática. Para os republicanos era mais uma demonstração de que o Império não seria capaz de reformar-se a si mesmo. Mas, até aquele momento Ouro Preto ainda acreditava que o Império teria condições de atender às reivindicações que vinham das ruas e, dessa forma, assegurar a própria sobrevivência, pelo menos por mais algum tempo. Foi desmentido pelos acontecimentos das semanas seguintes.

Irritado com a apresentação do programa de reformas dos liberais, o deputado Gomes de castro apresentou uma moção de desconfiança ao Ministério, que foi aprovada por 79 votos contra 20. Diante do impasse produzido pela moção, o Imperador decidiu dissolver a Câmara e convocar novas eleições, em uma tentativa de recompor a base aliada no Parlamento. Realizado em 31 de agosto, o pleito conferiu maioria esmagadora ao partido do governo, como tinha acontecido ao longo de todo o Segundo Reinado. No entanto, dessa vez, os novos deputados não teriam tempo de assumir seus mandatos, pois a República chegou antes.

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